terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

UM FRAGMENTO DA HISTÓRIA DA CIDADE DE SÃO DOMINGOS DO ARAGUAIA SOB A ÓTICA DE UM MORADOR ANTIGO

Em conversa informal com o senhor Raimundo “Preto”, da família Cabral, que migraram do Maranhão para a localidade de Centro das Latas, no começo da década de 1950, ouvi o relato de como ocorreu a fundação dessa localidade. O senhor Raimundo “Preto” começa falando de um morador mais antigo que ele, Raimundo Ribeiro, que habitava numa localidade chamada Açaizal. Essa localidade era às margens do rio dos “Veados”, na beira da Estrada do Bois. Para o senhor Raimundo “Preto”, o Raimundo Ribeiro era “terecozeiro”, ou seja, adepto do Terecô. Raimundo “Preto” relata que Raimundo Ribeiro fez uma “pinicada” (vereda) beirando o rio dos Veados, que ligava sua localidade de morada, o Açaizal, a outra localidade, chamada Canadá. Ele deu nome a outras localidades que serviriam de paradas nas procissões realizadas durante a semana. Na segunda-feira, o Raimundo Ribeiro saia do Açaizal com outras pessoas em procissão e iam realizar o terecô no Brejo-de-raiz; na terça-feira, o terecô seria realizado na localidade de Eira Velha; na quarta-feira, o terecô aconteceria em Santa Cruz; na quinta-feira, era a vez de Oiteiro da Cruz; na sexta-feira, a localidade escolhida era Braço da Cruz; no sábado, ocorreria no Canadá; e, no domingo, voltavam para o Açaizal. Das localidades citadas, apenas Brejo-de-raiz, Oiteiro da Cruz (hoje conhecido apenas como Oiteiro) e Canadá persistem com esses nomes. As outras localidades deixaram de existir com esses nomes e foram transformadas em pastagens de propriedades particulares e recebem os nomes das propriedades. Raimundo “Preto” ainda relata que outro homem, chamado Bento, gostava de caçar e vinha até da vila de Apinagés até a localidade do Cajueiro, próximo à Vila de Bela Vista (essa vila ainda faz parte do município de São João do Araguaia). Daí, Bento se embrenhava na mata a procura de caças. Um dia, Bento saiu para caçar e encontrou a “batida” (rastros) dos “porcão” (queixadas). Seguiu a “batida” até encontrar os “porcão”, matou dois e tentou voltar. No entanto, já era tarde e ele, Bento, não conseguia encontrar a “batida” de voltar. Então, abriu uma picada com os porcos nas costas e saiu embaixo de uns pés de manga, onde encontrou algumas latas. Ele viu que não daria para voltar para o Cajueiro no mesmo dia então resolveu acampar embaixo dos pés de mangas, onde fez um fogo para secar a carne dos porcos. No outro dia, Beto fez uma “vareda” (vereda) ligando os pés de mangas ao Cajueiro. Então essa localidade passou a ser um dos locais de caçada do Bento, que passou a chamá-lo de “latas”. Para Raimundo “Preto”, foi Bento quem trouxe, ou quem guiou, os Serafim (primeiros moradores da localidade que deu origem a cidade de São Domingos do Araguaia) até seu ponto de caçada que ele denominou de “latas”. Raimundo “Preto” relata que Bento guiou os Serafim até as “latas” (onde hoje é a Maçonaria de São Domingos do Araguaia) e voltou para Apinagés. Raimundo “Preto” fala também sobre a primeira missa rezada na localidade de Centro das Latas. Ele diz que o dominicano Frei Gil rezou a primeira missa na localidade debaixo de uma “latada” (cobertura improvisada para abrigar pessoas) na casa de Acrisio Santos, que fica atualmente onde morava o senhor Gabriel. A partir daí, Raimundo “Preto” fala que foi o frei dominicano que deu o nome de São Domingos a essa localidade, pois o povo não gostava que chamassem de Centro das Latas.